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Review: Ney Matogrosso @ Befly Hall, Belo Horizonte – 12/09/2025

Ney Matogrosso vive um momento de popularidade ascendente desde o sucesso da cinebiografia Homem com H. Com mais de 50 anos de carreira e 84 de vida, a atenção renovada está longe de ser uma novidade em sua carreira iniciada com uma das melhores bandas de todos os tempos, o Secos e Molhados. Com apresentações esgotadas nas capitais brasileiras, Ney sempre foi (e será) um artista atemporal. Por isso mesmo, turnê Bloco na Rua, que retornou a BH para duas noites esgotadas, é tão memorável.

O primeiro motivo é a urgência de, como um apaixonado por música e shows, se presentear com a oportunidade rara de presenciar um nome do calibre de Ney Matogrosso ao vivo. É parte da história da música brasileira e mundial. É uma lenda viva. Não é um qualquer.

Depois porque é a constatação que nem toda lenda vive da sua história e legado. Artistas com metade da idade de Ney parecem viver dentro de um vórtice de um tempo em que as pessoas dependiam das rádios ou MTV para descobrir música boa. A maioria abraça a própria irrelevância, mas um show do Ney é diferente. Ele até pode seguir o roteiro, repetir músicas e interações, mas não é a mesma coisa. Parafraseando o próprio cantor, “dizem que todas as maçãs são iguais”, mas quem dera fosse o caso.

Ao longo de pouco mais de 1h20, Ney Matogrosso fez cada alma presente no Befly Hall sentir como se tivesse ganhado na loteria. Olhava ao redor e o público, majoritariamente formado por quem ultrapassou a barreira dos 50, 60 anos, vibrava. A plateia se controlava para permanecer nas cadeiras. Vez ou outra, alguém se levantava para ficar no cantinho lateral do palco e deixar a emoção falar através do corpo. Lá de cima, Ney conduzia o espetáculo e observava com um olhar majestoso, tradicional dos leoninos.

Sempre discreto em suas manifestações políticas, nem mesmo a condenação do ex-presidente a 27 anos e 3 meses de prisão fez Ney se pronunciar. Diretamente, pelo menos. Em “Pro Dia Nascer Feliz” posso ter notado uma empolgação extra e sutil no refrão. Uma mensagem misteriosa e enigmática, quem sabe? Na verdade, pouco importa. A verdade é que uma manifestação direta poderia deixar um gosto amargo no show e incomodar o público mais conservador e/ou apoiador do ex.  E aqui temos o terceiro motivo da importância de Ney: a sua arte fala e dispensa opiniões expressas em palavras. Há quem goste. Há quem reclame. Em comum: todos estão vivos.

Existe uma releitura ótima de “Sangue Latino”, que abandona a sua levada original com a linha de baixo marcando e parte para um groove de primeira. A melhor parte de acompanhar artistas experientes ao vivo é seu desapego com arranjos. Ney Matogrosso brinca com as dinâmicas para criar texturas vocais hipnotizantes. Mudanças de intensidade e força das notas podem parecer imperceptíveis no consciente, mas tem um impacto enorme.

O final do show ficou com “A Balada do Louco”, clássico eterno dos Mutantes, e “Homem com H. Nessa hora, não preciso dizer, o público abandonou as cadeiras para balançar o esqueleto e ficar mais pertinho de sentir o quanto Ney Matogrosso é único e especial.