Imagine você ter a oportunidade de comemorar uma história de mais de 40 anos. Imagine também ter um público apaixonado celebrando essa marca histórica — incluindo pessoas diversas com idade entre 20, 40 ou 60 anos. Não é exagero ou papo de um apaixonado: cada vez que Os Paralamas do Sucesso entram em ação para um show, é história sendo feita. Mais de 10 mil pessoas testemunharam mais um capítulo dessa história no último final de semana, quando a capital mineira recebeu duas apresentações lotadas para a turnê Paralamas Clássicos.
Não tenho certeza de quantas vezes vi o Paralamas ao vivo. Estive na gravação do DVD com o Titãs em 2008, vi em BH em 2014 e dois anos depois em 2016. Coincidência ou não, a apresentação de 2014 era comemorativa dos 30 anos de carreira. Por isso, como fã de longa data (meu profissionalismo tira férias quando se trata de bandas que eu realmente amo), posso dizer que quem não estava no Befly Hall perdeu um show fenomenal. Não precisa nem ser fã. Basta ter audição.
Durante mais de duas horas, os caras enfileiraram sucesso atrás de sucesso. Às vezes, Herbert Vianna puxava uma interação ou outra com a audiência, mas a energia era de tocar sem parar com vontade e tesão. A empolgação era tanta que em mais de uma oportunidade a banda tropeçou, mas Vianna se explicou sorrindo: “é culpa da ansiedade de compartilhar essa energia boa com vocês”. Tá tudo bem, Herbert. Ninguém nem reparou. E faz parte do show.
Fiz questão de pontuar minha paixão pela banda porque fã é chato. Nunca tá 100% satisfeito. Ainda não foi desta vez que ouvi “Fui Eu” ao vivo. Porra, gente. Que tal incluir ela em 2026? Mas nunca tinha visto uma noite tão inspirada do Paralamas. Foi de encher os olhos. Finalmente vi “Uns Dias” ao vivo e ganhei uma inesperada releitura de “Should i Stay or Should i Go”, do The Clash.
Som alto como todo show precisa ser e até a acústica do Befly Hall contribuiu, na medida do possível. E quando você tem um baixista como o Bi Ribeiro na sua frente, se cria uma urgência primitiva de sentir os graves no chão misturados com o bumbo da lenda viva João Barone. É muito privilégio poder ver esses caras ao vivo. O pop rock brasileiro tem uma dívida eterna com os Paralamas.
O que mais chamou a minha atenção foram os arranjos de voz e o beat de boa parte do repertório. Vianna mudou a forma de cantar seus versos ao mesmo tempo em que reduzia a velocidade das músicas. Como diz Roberto Carlos: “Detalhes tão pequenos de nós dois”, mas que se tornaram uma das grandes atrações da noite e me deixaram com um sorriso de orelha a orelha. Poderiam muito bem chegar no piloto automático e tocar tudo como na gravação, mas a decisão de promover pequenas renovações no acervo é também uma forma de manter a chama acesa de propor coisas novas.
Se você gosta dos Paralamas e nunca teve a chance de ver a banda ao vivo, confie em mim. Talvez não exista uma outra oportunidade tão imperdível de corrigir essa lacuna cultural na sua vida. Já dizia um ídolo: “o amor não sabe esperar” e você não deveria insistir nesse erro. Que show épico.